terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Desenvolvimento ou sociedade sustentável?

A reflexão crítica tem criado vasto convencimento de que o propalado ‘‘desenvolvimento sustentável’’ no sistema capitalista (pode ser válido num sistema localizado) é uma armadilha que cabe denunciar. A lógica do desenvolvimento neste sistema imperante contradiz a lógica da sustentabilidade. Ele se entende linear, ilimitado e supõe o infinito dos recursos da natureza. A sustentabilidade nos alerta de que vivemos num pequeno planeta, super-habitado, com recursos limitados, alguns renováveis e outros não. Se não elaborarmos um desenvolvimento (que precisamos) bem dosado e equitativo do qual todos possam se beneficiar, inclusive os demais membros da comunidade de vida à qual pertencemos, podemos ir ao encontro de um desastre.
Analistas como o prêmio Nobel de química Christian de Duve começa seu conhecido livro Poeira vital: a vida como imperativo cósmico afirmando que estamos assistindo a sintomas globais que, outrora, no processo evolutivo, antecipavam grandes devastações que atingiram a Terra. Mas há uma diferença, diz ele: outrora eram meteoros rasantes ou cataclismas naturais que devastavam a biosfera. Hoje o meteoro rasante mais perigoso se chama ser humano. Temos que cuidar e vigiar esse meteoro ameaçador e imprevisível. A melhor forma de fazê-lo é deslocar o eixo do desenvolvimento para o da sustentabilidade. O que importa é termos uma sociedade sustentável que encontre para si o desenvolvimento de que precisa para garantir a base material de sua reprodução fazendo com que então o desenvolvimento participe desta sustentabilidade. Como é a sustentabilidade? Uma sociedade é sustentável quando se organiza e se comporta de tal forma que ela, através das gerações, consegue garantir a vida dos cidadãos e dos ecossistemas na qual está inserida. Quanto mais uma sociedade se funda sobre recursos renováveis e recicláveis, mais sustentabilidade ostenta. Isso não significa que não possa usar de recursos não renováveis. Mas, ao fazê-lo, deve praticar grande racionalidade, especialmente por amor à única Terra que temos e em solidariedade para com gerações futuras. Há recursos que são abundantes, como o carvão, o alumínio e o ferro, com a vantagem de que podem ser reciclados. Uma sociedade só pode ser considerada sustentável se ela mesma, por seu trabalho e produção, se tornar mais e mais autônoma. Se tiver superado níveis agudos de pobreza ou tiver condições de crescentemente diminui-la. Se seus cidadãos estiverem ocupados em trabalhos significativos. Se a seguridade social for garantida para aqueles que são demasiadamente jovens ou idosos ou doentes e que não podem ingressar no mercado de trabalho. Se a igualdade social e política, também de gênero, for continuamente buscada. Se a desigualdade econômica for reduzida a niveis aceitáveis. Por fim, se seus cidadãos forem socialmente participativos e destarte puderem tornar concreta e continuamente perfectível a democracia. Por estes critérios o Brasil está ainda longe de ser uma sociedade sustentável. Tal sociedade sustentável deve se colocar continuamente a questão: quanto de bem-estar ela pode oferecer ao maior número possível de pessoas com o capital natural e cultural de que dispõe? Obviamente esta questão supõe a prévia sustentabilidade do Planeta, sem a qual todos os demais projetos perderiam sua base e seriam vãos.
Leonardo Boff


- Leonardo Boff é filósofo e este texto foi publicado no jornal A Tribuna no dia 15 de setembro de 2006

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Rogério Wong

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