quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

A CASA DAS PALAVRAS

Andam dizendo que uma imagem vale mais que mil palavras. É uma frase de efeito, com ar de modernidade. As pessoas acreditam, ate repetem. Mas não é verdade. Os próprio cultores da imagem tiveram que cunhar uma frase para louvá-la, talvez por achar difícil criar uma imagem que dissesse a mesma coisa, com a mesma clareza. Felizmente o mundo está cheio de pessoas que amam as palavras e que se encantam com elas.
E agora vou plantar aqui uma palavra que é um nome: Medellín. E sei que na cabeça de todo mundo essa palavra evoca varias outras: drogas, tráfico, cartel, violência. À distância, essas parecem ser as únicas palavras daquela cidade. Não são. Medellín – eu estive lá e sei – é uma cidade que ama especialmente as palavras.

Ali acontece todo ano um festival de poesia surpreendente, que ocorre em escolas, teatros, igrejas, praças, tudo ao mesmo tempo, e tudo lotado. Ali atuava, quando lá estive, um grupo chamado Ratos de Biblioteca, de estímulo à leitura. E dali me chega agora um encantador livro de palavras chamado Casa das estrelas.
Claro, todo livro é de palavras. Mas este, como explica seu autor, Javier Naranjo, surgiu como um jogo em que crianças do primário eram convidadas a dar o significado de algumas palavras. As palavras eram frequentemente escolhidas pelas próprias crianças. E o “jogo”, que era muito sério, durou vários anos. Ao fim, foi feita uma seleção corrigindo-se apenas a ortografia. E do resultado final, transcrevo aqui algumas frases, agradecendo a Naranjo e às crianças.

Adulto: Pessoa que toda vez que fala, primeiro é dela. (Andrés Bedoya, 8 anos)

Água: Líquido que não se pode beber. (Nélson Ramírez, 7 anos)

Amor: É o que cada coração junta para dar a alguém. (Lina Maria Murillo, 10 anos)

Conseguir uma namorada aqui e outra em minha casa, e quero que a minha mãe emagreça porque está muito gorda. (Orlando Vasquez, 6 anos)

Ausência: É que eu vou morrer. (Yorlady Rave, 8 anos)

Assassinato: Tirar o melhor da pessoa. (Juan Restrepo, 9 anos)

Deus: É o amor com cabelo comprido e poderes. (Ana Milena Hurtado, 5 anos)

É uma pessoa em que cravam cravos. É jovem. (Sebastián Uribe, 5 anos)

Dinheiro: É o fruto do trabalho mas há casos especiais. (Pepino Nates, 11 anos)

Eternidade: É quando numa casa todos os filhos casam, não se pões música, não tem confusão. Essa casa parece uma eternidade. (Blanca Henao, 10 anos)

Lar: O lar é alguma coisa que de repente se separa. (Juliana Escobar, 10 anos)

Igreja: Onde se vai para perdoar Deus. (Natalia Bueno, 7 anos)

Lembrança: É uma coisa de pequeno a grande. (Fabián Loiza, 12 anos)

Mãe: Minha mãe cuida muito de mim, gosta muito de mim, me dá comida quando quero. (Camilo Gómez, 7 anos)

A mãe é a pele da gente. (Ana Milena Hurtado, 7 anos)

Medo: É que a minha mãe dirige um carro e uns senhores do viaduto não podem comer e quebram o vidro do carro e matam ela e matam meu pai e eu vivo sozinho. (Orlando Vásquez, 6 anos)

Morto: Ser humano insensível. (David Casadiego, 10 anos)

Nada: É quando pergunto a alguém se viu alguma coisa. (Juan Osório, 8 anos)

Criança: É um ser humano, são más às vezes, são boas às vezes, choram, gritam, brincam, brigam, tomam banho; às vezes não tomam banho, se metem na piscina e crescem. (Natalia Calderón, 6 anos)

Tranqüilidade: Por exemplo, que o pai diga que vai bater e depois diga que não vai mais. (Blanca Henao, 10 anos)

Universo: Casa das estrelas. (Carlos Gómez, 12 anos).

Marina Colasanti

Um comentário:

Jean disse...

Acho que são esses pequenos aontecimentos que nos fazem pensar que apesar de tudo o ser humano pode ser algo belo. As definições das crianças expõem a essência das palavras na sua simplicidade. Beolo texto.